// Cartas para Gergelim – 04.01.20

Saudade de correr, filho(a).

De sentir o vento puxar a pele do meu rosto até quase sorrir involuntariamente. De por dentro estar pulando, cantando, gritando, chorando e por fora continuar a correr olhando pro chão. Saudade de perder o fôlego. Saudade de não sentir mais os pés tocando o asfalto e mesmo assim continuar.

Te escrevo pois quando digo isso pra alguém, eu já sei que vou escutar “não reclama né, é por um bom motivo”, “logo isso não vai importar mais isso”, “quando nascer piora”. E tudo bem, nenhuma novidade, mas não existe concorrência. Eu só queria dizer com todas as letras: saudade de correr nas últimas semanas, sem soar reclamação.

Saudade de bater os pés no chão incansavelmente, de ter que educar minha mente km por km a não esquecer o objetivo. Saudade de enfrentar minhas fraquezas para descobrir minhas forças.

Um dia tenho certeza que você encontrará algo que te fará se sentir assim. Já inventei o que fazer no lugar, mas não é a mesma coisa. Sei que vai me entender. Com você, me sinto segura em dizer, pois sei que me escuta e as vezes a gente só precisa ser ouvida, sem conselho, sem resposta pronta… só um ouvido que nos abrace. Isso é raro. Espero ter essa sensibilidade quando você um dia precisar de mim.

A vida tem seus momentos. E eu já tive que desacelerar ou parar diversas vezes sem querer. Dessa vez eu quero, mas pra isso, não preciso negar e anular a falta que me faz. E isso diz muito sobre a vida. Faz parte – no caso, uma imensa parte, de mim.

Como seu pai diz “guarda essa saudade com carinho”. A saudade, filho(a) também move o coração. Estou guardando. Sentindo o vento no meu rosto de outras formas, renovando os pés calejados e me relembrando de como isso faz eu me redescobrir no caminho. Foi correndo que me reconheci. Agora, guardo toda essa força pra te conhecer. A maratona que a gente mais sonhou viver.

Obrigada pela companhia nestes 6 meses e meio, durou mais que imaginei. Agora, não corre filho, descubra seu tempo.

Me entrego a essa nova, já infinita, parte de mim. Como uma corrida gostosa no domingo a tarde… você me traz esse sabor de liberdade no coração. Não existe linha de chegada. Vale pra nós.