Quando eu era criança eu lembro de que eu amava estar rodeada de pessoas. Quanto mais, melhor. Adorava ir em lugares pra ter a oportunidade de conversar com todo mundo e correr pra lá e pra cá. Mas, independente de onde eu estivesse e da quantidade de pessoas que tinham, sempre chegava um momento em que eu esticava os olhos a procura da minha mãe. 

Era algo involuntário, inconsciente e que sempre acontecia. Até hoje enquanto escrevo esse texto, eu posso me lembrar da sensação. Um misto de alívio com completude. Um respiro profundo. Era como se independente do lugar, da circustância ou da situação, eu estava no meu lugar. E não era qualquer lugar. Era um check-in que só entre a gente era possível fazer.

Alguns dias atrás, minha filha fez três meses. Ela observa o mundo a sua volta com toda curiosidade possível de quem ainda não sabe bem o que está vendo. Ela vê uma cadeira, mas ainda não sabe o que é uma cadeira. Ela vê nossa cachorra e ainda não sabe o que é um cachorro. Ela vê uma flor e é a primeira vez que está vendo uma daquela cor, daquele tamanho e com aquela luz do dia. Tudo é novo. Tudo sempre é novidade. Todo lugar é empolgante.

Meu filho mais velho, apesar de ter quase 3 anos, carrega essa mesma alma. O olhar de quem aproveita tudo. Assim como eu, ele também gosta de estar entre muitas pessoas, participando de conversas e ouvir novas risadas. Então a gente topa qualquer função para leva- lo sempre em eventos com a gente. 

Dia desses a nossa família toda foi para um casamento. Nós sabíamos que ele ia curtir muito estar rodeado de tanta novidade e de diversas pessoas diferentes. O espaço em si, era simples. Mas para ele, todo lugar é extasiante.

Ele corria pra lá e pra cá, subia rampa, pulava degrau da escada. E em alguns breves momentos eu podia ver seus olhinhos me procurando. Ele esticava o pescoço por entre os vasos da decoração, ora atrás da porta, ora passava por onde eu tinha deixado minha bolsa. Já a Elis ficou boa parte da festa no sling, cochilando coladinha em mim. Até que em um determinado momento da festa, quando ela acordou, eu consegui – finalmente – ir até o banheiro. Não sei dizer quanto tempo fiquei ali, mas foi tempo suficiente para vir a calhar o momento exato em que os olhos dele me caçaram por aquele espaço. 

Ele deve ter visto minha bolsa, mas não me viu ali perto.
Deve ter corrido até um novo ângulo, mas eu ainda assim não aparecia.
Ele conversava e dançava com novos amiguinhos, estava feliz, mas era como se não soubesse onde estava. 

Volto para o salão e sinto um abraço nas minhas pernas. Não só nossos olhos se encontraram, como nossas mãos. Ele me escalava até que eu não fosse mais possível me manter de pé. Me abaixei e estávamos no mesmo nível, olhos no olhos. Ele se aninhou em mim. Colocava a mão no colo do meu peito. Eu não entendia bem o que ele estava tentando fazer, até que colocando a cabeça deitada na minha pele, ele disse:

-Quero ouvir o coração da mamãe. Faz tumtumtumtum!

Assim como quando eu era criança e procurava os olhos da minha mãe, naquele momento, ele procurava o seu lugar. 

O lugar, era eu.

A festa estava ótima, mas o lugar onde meus dois filhos queriam estar, era em mim.

Eu sorria enquanto tentava decorar cada palavra que ele tinha dito. Sorria enquanto aproveitava aquele calor humano pois poderia parar a qualquer instante. Sorria me lembrando de quantas vezes nos últimos três meses eu me sentia cansada de estar sempre sem espaço pessoal, sempre com alguém em cima de mim. Sorria validando meu cansaço, mas compreendendo que, ali, naquela conexão, morava uma recompensa especial. E eu precisava receber aquilo, me abastecer desse amor para depois jorrá-lo de volta.

Mãe é lugar que transcende espaço, onde o abraço reverbera para além do momento.

Mãe é lugar que o cheiro de colo surge quando precisamos de calma
Mãe é lugar que o tom da voz vem em mente para consolar o inconsolável.

Mãe é lugar que vê sempre a frente, pois procura preparar-se para tudo… para estar sempre de peito aberto.

Mãe é lugar de pouso.

Agora eu era o porto, era o seguro. Era o check-in no mundo dos meus filhos. Agora independente de onde eles estivessem, eles preferiram estar em mim. E eu estou por eles. Independente de para quão longe eles forem um dia, sempre serei morada. Esse lugar de pouso que ecoa, que incentiva, que engrandece, que acolhe.

Sou mãe, sou lugar.

E estou exatamente no lugar onde deveria e quero estar – foi o que me lembrei enquanto aguardava o cochilo da minha filha terminar.

O mundo pode esperar… Pois o meu mundo cabe bem aqui. Em mim. Nesse lugar.