Não sei vocês, mas alguns dias.. eu só queria ficar quieta. Parada, imóvel, arrisco dizer que quase inexistente no mesmo lugar. Não é minha intenção que essa frase soe melancólica demais – o que também não teria problema algum. Mas é que não é o caso. As vezes eu só queria ficar quieta. Ter um botão de pause, sabe?

Não pensar que o carro quebrou e vou ter que trabalhar mais pra pagar o conserto não pensar que a mensalidade atrasou que preciso comprar cartolina e tinta não pensar que não faço há unha há meses e mesmo que isso não seja tão importante pra mim assim sei lá eu queria mas ai lembro que preciso ir a SP pra consultar o dentista e preciso também visitar uma amiga que não vejo há meses! nem contei pra ela que meu sogro recém fez uma cirurgia, que tenho uma nova ideia de livro e que falando em livro preciso pensar em alguém pra cuidar do meu filho enquanto participo do lançamento do meu atual livro e por isso preciso arrumar o carro senão não tenho como ir e justo agora que comecei realmente a dirigir não posso parar mas agora não posso fazer nada talvez aproveitar essa meia horinha que tenho livre antes de pegar o meu filho na escola e ler um pouco ou lavar a louça mas é segunda é dia de lavar o lençol mas eu preciso colocar as Dms em dia senão vão pensar que sou mal educada na internet e agora acho que meu marido me chamou mas se eu ficar quietinha aqui talvez ele pense que eu estou ocupada e desencane

mas

o que

eu tô

fazendo

mesmo?

Assim. Sem vírgula, sem ponto, sem nada. A cabeça só vai. Pensa. Pensa. Pensa. Pensa tanto! Emenda. Uma pauta e assunto no outro que eu as vezes, de verdade, só me restar rir. As vezes, do nada, eu solto uma risada. Alta. Sem explicação. Sou risada do tanto de assunto que ela tem, inventa e arranja.

As vezes eu também penso se existisse um botão de liga/desliga pra nossa cabeça. Cheguei a conclusão com nenhuma conclusão, mas valeu a divagação. A mesma cabeça que me cansa é a mesma que me faz ser cada vez mais eu mesma, mais humana, diante de um mundo que deixou de querer pensar.

Isso é estranho. Não pensar.

Imagine não precisar pensar para fazer absolutamente nada? Tem gente que vive assim. Não sei como. Deve ser um silêncio ensurdecedor. Indigesto. Superficialmente gostoso, mas a longo prazo, penoso. Por isso, apesar do barulho e do caos, prefiro pensar. Mas, pensar com gosto. Pensar com alma. Pensar sem pensar no que pensei. Pensar e deixar pensar. Como escrever, como digitar, como clicar no postar quando chegar ao final desse texto sem reler e cogitar que ninguém irá se identificar.

As vezes é melhor pensar só pela gente… não só na gente. Mas, pelo direito de pensar aquilo que se verdadeiramente pensa. As vezes sinto que nossos pensamentos já veem ensaiados, coreografados na dança no formato de reels que podem engajar e com 140 caracteres para caber em um twitter. As vezes sinto que pensar só por pensar é como um exercício interno que nos deixa mais calejados e também mais fortes.

Tenho buscado me deixar pensar. Abraçar essas palavras soltas que só saem e se colocam em suas posições como desejam e se sentem confortáveis para estar. Tenho buscado entender o que é reflexão e o que são assuntos que eu poderia criar uma lista por onde de importância. Funciona pra mim. Mas, nem sempre minha cabeça confia nessa lista. Ela volta o tempo todo a pensar nisso e naquilo – e as vezes, eu não dou corda. Ignoro. Sinto que é o melhor que faço. Deixo jogar ali as palavras e sensações como uma caçamba. Um entulho, um download que precisa ser feito e não deve ser refeito. Tenho buscado me olhar com mais graça e com menos julgamento. E nem sempre é fácil. Mas, é sempre melhor.

Me deixo pensar. Me deixo escrever. Me deixo dizer. Me deixo sentir. O que precisarei fazer com tudo isso é um próximo passo. Agora, só preciso deixar ser… assim. como é. Como um texto mais escrito, uma crônica mal feita, uma redação sem formato. E assim, quando termina, quando arremesso, lanço, deposito, abro mão, deixo sair de mim com palavras que sequer rimam…. alivio.

Volto a ver o mundo. Volto a ver vida. Volto a olhar sem cerrar os olhos da alma. Pois aceito a vida como é e com o que tiver quer ser.

As vezes eu só quero estar quieta.

E então, eu me deixo quieta….

aceito a quietude.

e fico.

Me deixo quieta, mas eu não me deixo. Nunca, jamais.