– Não foi um caminho reto, né Amor?

Essa foi a frase que meu marido me disse na noite em que cheguei em casa depois do lançamento presencial do meu livro “Muito Além do que Sonhei“. Naquele instante, tudo fez sentido. Não que antes não tivesse feito, mas ele conseguiu dar nome a minha trajetória/carreira/carteira-não-assinada. Ele me fez ver que ter sucesso não era -só- estar 20 anos na mesma empresa.

Digo isso, porque assim como muitos, eu cresci com essa referência. Na minha casa meu pai trabalhou 20 anos em um empresa, 10 na outra e voltou pra de 20 anos e está há mais sei lá quantos. Meu pai nunca me cobrou que eu seguisse este mesmo caminho, mas é inevitável não pensar que talvez a nossa geração fosse ansiosa, ambiciosa e até presunçosa demais em querer gostar de algo, fazer bem e conseguir sustentar-se financeiramente com isso. Eu demorei anos para aceitar.

Quando eu tinha 10 anos, comecei a fazer curso de pintura em tela com tinta a óleo. Eu adorava aquele momento pois era um contraponto a toda energia insana que eu gastava correndo pela casa nos outros 90% do dia. Lembro da sensação que foi quando uma senhora viu uma tela minha e perguntou a professora quanto era. E eu não soube responder. Na época, elas chegaram a um valor e pra mim ficou ótimo. Voltei para casa orgulhosa mostrando para meus pais. Mas, aquele momento, mais do que tudo, batia de frente com tudo que eu ouvi a vida inteira: você acha que eu gosto do meu trabalho? eu vou lá, faço o que tenho que fazer, volto pra casa e pago as contas. Aquela primeira tela me deu a esperança de que eu poderia gostar – não o tempo todo – mas um pouquinho mais dos meus caminhos.

Não demorou muito para que eu começasse e montar bazares para expor minhas telas – e roupas que eu revendia junto com minha mãe em salões de beleza. Eu ganhava um troco aqui e ali. O suficiente para pagar um peça de roupa que eu gostava, mais acessórios para pintar, etc. Logo, aconteceu o que eu não imaginava: eu não gostava tanto de pintar assim. Eu não gostava tanto de roupa/moda como pensava. Foi um choque. Como assim? eu adoro falar sobre isso, ler sobre isso, pesquisar sobre isso, quero saber novidades desse universo… mas eu não gostava de ter que, sempre, fazer isso.

Eu lembro exatamente desse momento porque ele me provocou grandes decisões que vieram em seguida da minha vida. Mesmo nova, eu cansei de contar moedas. Eu sinalizei que ia mudar de escola e faria um curso técnico pois queria encontrar um trabalho. Foi quando comecei a fazer processamento de dados (A mesma área do meu irmão, pai, tio) e consegui uma vaga em menos de 3 meses de curso. Não sabia nada, não gostava de nada, mas me pagavam legal e tinha chance de crescimento… Por quê não?

Quando eu me trocava para trabalhar eu praticamente me fantasiava. E eu adorava o desafio de me vestir de “gente grande” do meu jeito. Fiz calça, fiz blazer com outras estampas que eu não encontrava. Eu me divertia. Cogitei pensar que algo em mim ainda gostava de moda/arte e pudesse trabalhar com isso. Cheguei a vender uma das calças que desenhei para uma colega de baia. E eu nem imaginava que, no final do dia, o professor me diria exatamente o que eu precisava: você não tem que trabalhar só com o que gosta… mas com o que gosta, faz bem, faz para além de você e os outros te pagam para isso. Hoje, eu acrescentaria algo a mais: e que você se vê vivenciando aquela rotina, aquele estilo de vida, da profissão – ou seja capaz de criar o seu próprio.

Não contei metade das coisas que me envolvi profissionalmente na vida neste texto. Mas, enquanto meu marido conversava comigo era essa cena que se passava na minha cabeça. Ele completava sua frase:

-Você rodou de processamento de dados, fotógrafa, redatora, blogueira, Instagrammer, criou um canal no YouTube, juntou uma galera para falar de um assunto… aiiiii, lançou um livro.

Quis contar esse breve resumo aqui, pois um sonho nunca é feito de um dia pro outro. E eu acredito que hoje em dia a internet tem nos roubado isso: as histórias. o tempo cronológico. o tempo que constrói de verdade. Afinal, não vivemos esse mesmo tempo nas redes sociais.

Eu sonho em ser escritora desde meus 8 anos de idade. Cresci em uma casa onde todos leem muito. Cresci ouvindo que um livro é melhor amigo, é companhia, é provocação, é conhecimento, é afago, é revolução. Foi através das palavras que eu encontrei tudo isso, tudo o que queria. Mas, eu sempre duvidei disso. Sempre duvidei e, por muito tempo, confesso, eu desisti. Desencanei. Fiquei vendo o que ia acontecer. Mas era impossível. Era mais forte que eu. Então, ainda que eu estivesse em um momento de espera, meu coração ainda se direcionava para aquilo. Meu coração teimoso ainda dizia que assim eu poderia alcançar outros corações.

E eu espero que, através desse texto, eu consiga alcançar o seu. Eu conseguia ter fazer continuar nessa busca daquilo que podemos oferecer ao mundo. Investir e insistir nos seus sonhos para que eles sejam seu, independente do caminho, tão não-linear que a vida ofereça.

Como me disse uma professora de literatura após ler meu caderno de versos:
Continue, continue com seu coração.

Continuo. Independente do que diz minha pessoa jurídica. Continua com o coração.