Desde que a gente mudou de casa estamos diariamente resolvendo aqueles pequenos detalhes inofensivos mas que fazem diferença: uma tampa de privada, a limpeza profunda no sofá, trocar as maçanetas por um modelo em que a cachorra não abra a porta sozinha, o chuveiro.

Ah, o chuveiro!

Desde o primeiro dia Fabinho correu para ajeitar o bendito! Aqui, a gente tem a teoria de que não importa tanto o lugar, o que faz você se sentir quase automaticamente em casa é quando o chuveiro é do jeito que você gosta. E cada um gosta de um jeito: ducha fraca com pouca vazão, ducha intensa e concentrada, ducha larga com muita pressão. Tem para todos os gostos e manias – só vamos concordar que ninguém merece aquela única gota direcionada para o lado inverso e que costuma ser gelada.

Eu sou cheia de mania com chuveiros. Um banho ruim é capaz de estragar meu dia – nesse nível. Gosto de banho quente, com ducha forte, concentrada e que você quase não precisa fazer força para tirar o shampoo do cabelo. Só fica ali embaixo, curtindo, como uma cachoeira. Obrigada, vida! Agradeço todo dia pelo privilégio do banho gostoso.

Enfim, casa nova, drama novo no chuveiro. Chegamos e não tinha nenhum instalado. Compramos o que julgamos atingir todas as expectativas e pronto. Resolvido. Sim, mas não.

Todo dia quando eu girava a torneira, tomava uma ducha na cara, nas pernas, na barriga… o chuveirinho estava SEMPRE ativado. Sério. SEMPRE. E não importava a posição, sempre era uma dança do chuveirinho molhando todo o lado até eu conseguir segurar.

Todo dia eu pensava: que raios Fabinho deixa esse chuveirinho assim?!? Pra quê? Todo dia, todo banho.

No começo ou ri, mantive o bom humor. Dois dias depois, estava xingando ele mentalmente mesmo repetindo pra mim mesma: lembra você de checar o chuveirinho antes Q COISAAAA!!! Afinal, eu tinha minha parcela na história – se o chuveirinho me irrita, eu quem devo lembrar de desativar antes da minha vez de usar. Eu sabia, tinha total consciência. Mas, era inevitável, eu estava usando a minha lógica para algo uma mania de outra pessoa que fazia lógica para ela. Não tinha lógica.

Depois de anos casados tem coisa que irrita, mas que é uma questão de tempo certo pra dizer. Imagina? Eu não ia largar essa pauta do nada no meio do café da manhã: todo dia eu levo um banho do chuveirinho porque você deixa aquela coisa ligada?!?! Precisava esperar o momento certo ou precisava lembrar de desligar o chuveirinho ou precisava rir mais.

Sei lá. Só que um dia a noite eu percebi uma goteira na ducha do chuveiro. OPA! esse é o momento, pensei. Estávamos os dois escovando os dentes e Fabinho abriu o box. Quando eu ia começar o meu sermão do chuveirinho, ele me diz: – Amor, antes que eu me esqueça! eu não sei se você percebeu, mas eu deixo o chuveirinho ligado porque senão fica um barulho chato de goteira. Todo dia depois que você toma banho eu venho e faço isso porque com o chuveirinho ligado, não fica goteira que é muito chato né? Enfim, depois arrumamos isso!

HÁ!

Minha cara de tacho foi visível. Ele obviamente não entendeu nada. Mas, uma parte da minha cara provavelmente derreteu de tanto segurar o riso daquela situação. Ele não estava me enchendo o saco e nem muito menos percebia que estava, ele estava trazendo uma solução provisória para algo irritante pra ele. Eu estava esperando outra atitude para com algo que era irritante pra mim – antes de entender o lado dele.

Aquele dia eu contei pra ele o que eu vinha pensando nos últimos tempos. Rimos juntos de uma situação que parecia uma coisa na cabeça dele e outra coisa na minha. Rimos de algo cotidiano que poderia gerar uma grande bagunça se não tivesse sido bem explicada, tin-tin por tin-tin.

Como diz minha analista, “eu não sei como o ser humano se entende. A comunicação humana é uma loucura. Uma arte”.

Comunicação é uma arte que não se expõe sozinha. A gente precisa ter a atitude de expor. A gente precisa contar sobre essa arte. A história por trás aquilo que o outro está vendo, apreciando. A gente precisa do outro. Tudo enquanto mora só na nossa cabeça faz sentido pra gente, pois ali é um lugar totalmente nosso. Tudo que mora na cabeça do outro faz sentido pro outro, pois ali é um lugar incontrolável, desconhecido e imprevisível. Muitas vezes ilógico aos nossos olhos. Aos NOSSOS olhos. A comunicação é ponte.

Depois desse dia, eu passei a entender. Como uma conversa de chuveiro tinha tantos sentidos. Como tantas conversas podem e devem ter muitos sentidos. Como devemos cuidar para que as nossas conversas sempre sejam esclarecidas e objetivas para quem importa pra gente. Como precisamos estar dispostos a ouvir, compreender e encontrar o ponto em que faça um pouco de sentido.

Afinal, sempre é tempo de refinar esses detalhes que fazem total diferença para nos sentirmos em casa. Seja lá onde a gente for. Nossa forma de comunicar com o mundo e com as pessoas é muito – uma imensa parte – do que levamos da gente.